1ª Leitura: At 15,1-2.22-29
Sl 66
2ª Leitura: Ap 21,10-14.22-23
Evangelho: Jo 14,23-29
“A cidade não precisa de sol, (…) sua luz e a sua lâmpada é o Cordeiro” (Ap 21,23)
A Palavra de Deus hoje nos apresenta, na segunda leitura, a continuação da visão de João na Ilha de Patmos. Naquele “Dia do Senhor” João foi transportado pelo Espírito e viu coisas maravilhosas. Também nós, nesse grande Dia do Senhor, neste grande Domingo que é o tempo pascal, somos também transportados pelo Espírito para esta Santa Assembleia, a fim de contemplarmos o mesmo que João contemplou. João viu a Jerusalém celeste. A Igreja é “já” e “ainda não” a Jerusalém celeste. A Igreja não é mais sombra do que deveria vir como era sombra o antigo Templo e a antiga cidade. Todavia, a Igreja ainda é imagem, uma imagem muito mais perfeita do que aquelas do Antigo Testamento, mas é ainda uma imagem da Jerusalém Celeste que Deus revestirá com as vestes nupciais no final dos tempos.
A Igreja, como a Jerusalém celeste, não precisa de ninguém que a ilumine, pois a glória de Deus é a sua luz e a sua lâmpada é o Cordeiro. Não é o mundo que nos ilumina; não são as pesquisas de opinião que devem orientar a vida dos cristãos; não são as reportagens nem as novas descobertas científicas que nos iluminam. A luz que ilumina todo homem é a glória de Deus; a lâmpada que nos guia neste mundo de trevas é o Cordeiro. Em cada Domingo acolhemos o Evangelho, Palavra da Salvação, que enche de luz o nosso coração e nos ensina a seguir o Cristo.
Do Evangelho deste domingo, o primeiro elemento que podemos destacar é o “guardar a Palavra”. Diz Jesus: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra”. Não podemos ter um amor simplesmente intelectual. Não nos basta dizer que amamos a Jesus. Esse amor que é dito e sentido precisa se expressar de forma concreta. A forma concreta de expressarmos o nosso amor ao Cristo é guardando a sua Palavra. Ele é a Palavra, como João nos diz no prólogo do seu evangelho. Jesus Cristo é o “lógos” do Pai. Ele é Aquele pelo qual todas as coisas foram feitas, pois, no Gênesis, tudo é criado à medida em que o pai profere o seu “lógos”, a sua Palavra. Deus “disse” e “foi feito”. Mas Cristo não se contentou em ser a Palavra criadora. Essa Palavra se fez carne e habitou entre nós (cf. Jo 1,14). Fazendo-se carne, comunicou-nos numa linguagem humana o que o Pai tinha a nos dizer.
Guardar a Palavra de Cristo é guardar a Ele mesmo. Guardar a Palavra significa abrir-se a um movimento de conversão contínua; significa que a cada momento da vida quando, quando nos encontramos diante das mais diversas situações, percebemos que há uma Palavra da Escritura que nos ilumina e guia. O contato pessoal e diário com a Palavra vai fazendo com que ela comece a ser escrita em nossos corações e a resplandecer em nós como luz.
Cristo fez e falou muitas coisas. Muitas dessas coisas os apóstolos não entenderam num primeiro momento. Cristo hoje promete o Espírito. O Espírito é o Paráclito, aquele que é chamado para estar junto. Nós somos a ekklesia, a assembleia convocada; o Espírito é o Parakletos, o que é chamado junto, para nos defender, consolar e, no trecho do Evangelho proclamado hoje, para “ensinar” e “recordar”. Duas palavras – ekklesia e Parakletos – derivadas do mesmo verbo kaleo, que significa ‘chamar’, ‘invocar’, ‘convocar’. O Espírito Santo é o Didáscalos, o Mestre, e é também a Memória Viva de Deus. O Espírito que Cristo comunicou aos seus apóstolos e discípulos fez com que eles entendessem de maneira nova, à luz dos acontecimentos pascais, o que Cristo havia feito e falado quando ainda estava no meio deles.
O Espírito também é o nosso Mestre Interior, aquele que nos ensina a guardar a Palavra e tudo o que ela contém. Quem guarda da Palavra apenas o que gosta ainda não se abriu ao Espírito. O Espírito é também a Memória Viva de Deus. Poderíamos traduzir esse trecho da Escritura dizendo que o Espírito “vos ensinará e fará memória de tudo o que eu vos tenho dito”. O Espírito vem para fazer memória da Palavra. Não se trata aqui apenas de uma memória psicológica.
O Espírito não vem apenas para que nos lembremos de fatos passados. Para isso, não precisamos do Espírito, porque a nossa memória humana é capaz de realizar isso sozinha. O Espírito não vem para fazermos uma memória meramente humana de fatos passados. O Espírito vem e vem com poder para que a Palavra de Cristo se torne presente na celebração em toda a sua força. O que Cristo fez e falou acontece quando nos reunimos, porque o Espírito vem hoje e agora sobre nós aqui reunidos, para que experimentemos a força da sua Páscoa na atual condição de nossa vida, com nossos problemas, nossas dúvidas, nossas lutas, cansaços, decepções, frustrações e pecados.
Isso nos enche de paz. Cristo hoje nos comunica a sua paz: “Deixo-vos a paz” (v. 27). Também o sacerdote, antes da comunhão, nos comunica a paz do Cristo: “A paz do Senhor esteja sempre convosco!” A Paz que Cristo nos dá Ele não no-la dá como o mundo. Não se trata de mera ausência de tribulações nessa vida. A Paz que Cristo nos oferece é a certeza de que “O Senhor dos Exércitos está conosco, nossa fortaleza é o Deus de Jacó!” (Sl 46 [45],12). Ainda que a terra vacile e os montes se abalem, ou seja, ainda que o mundo se acabe, que tudo despenque, e às vezes a nossa vida desaba sobre nossas cabeças, nada tememos, porque “O Senhor dos Exércitos está conosco, nossa fortaleza é o Deus de Jacó!” (Sl 46 [45],12). É a paz do Messias, a certeza da sua presença.
O trecho evangélico de hoje é finalizado com três promessas que brotam do Mistério Pascal: Ele vai, mas não nos deixará órfãos, pois enviará o Paráclito; além disso, Ele voltará no fim dos tempos, para fazer com que o projeto salvífico do Pai seja enfim consumado. Enquanto aguardamos sua vinda gloriosa, conservemos a alegria, pois mesmo no meio das maiores tribulações nós nunca estamos sozinhos pois, na força do Espírito, Ele permanece para sempre conosco.